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MÁSCARAS
Rituais e Celebrações, Farsas e Transgressões
Introdução
Do teatro Grego à Itália Renascentista, das sociedades tradicionais africanas à Europa rural, as máscaras sempre estiveram presentes em diferentes sociedades, assumindo formas plásticas muito diversas e servindo múltiplas funções sociais.
Em época de Carnaval, a galeria Cruzes Canhoto pretende explorar uma parte do complexo universo das máscaras, expondo máscaras tribais originárias maioritariamente de povos africanos em diálogo com máscaras portuguesas de Trás-os-Montes.
Se é certo que se trata de dois contextos diametralmente opostos, já que num caso estamos no domínio da denominada arte tribal africana e no outro na esfera dos costumes das sociedades rurais europeias, também é certo que entre eles é possível encontrar continuidades: em ambos os contextos as máscaras fazem parte de celebrações rituais onde a ordem social é temporariamente suspensa e onde a comunicação com as forças sobrenaturais está especialmente activada. De facto, e apesar dos fenómenos de retradicionalização e mercantilização que rodeiam as máscaras e os seus usos sociais, a utilização destes artefactos permanece ligada a momentos liminares, marcados pela dança, pela música, pela comida e pela bebida, e onde há lugar para a excentricidade e a transgressão de normas e comportamentos. Trata-se de momentos de “licenciosidade autorizada” ou de “anarquia legal”, o que aproxima o uso das máscaras das celebrações contemporâneas do Carnaval. Como refere o antropólogo Benjamim Pereira, a denúncia ritualizada dos desvios às normas estabelecidas desempenha uma função catártica que contribui para incutir nas sociedades um espírito mais agudo da realidade social, permitindo a coesão das comunidades.
Máscaras Portuguesas
As máscaras portuguesas que se apresentam nesta exposição são todas originárias de Trás-os-Montes e Alto Douro. Apesar de se desconhecer a origem exacta da utilização deste tipo de máscaras em certas alturas do ano, reconhece-se a sua ligação aos rituais de Inverno, associados ao fim de um ciclo agrícola e ao recomeço de outro, que surge com o aparecimento da Primavera. Segundo alguns investigadores, este tipo de máscaras, presente em várias zonas rurais europeias, integra práticas herdadas dos antigos cultos agrários, ligados à fertilidade dos campos e à mudança das colheitas.
Os momentos de culto são, porém, também momentos de conexão entre o mundo dos vivos e o mundo dos antepassados, onde há propensão para o aparecimento dos demónios, fantasmas e almas dos mortos. Por isso, dizem alguns, as máscaras transmontanas representam o diabo e os antepassados, bem perceptível nos dentes, nos cornos ou no uso da cor vermelha.
Ainda que actualmente a saída dos mascarados tenha perdido o seu caracter ritualístico e se tenha tornado numa performance cultural, algumas práticas dos antigos rituais parecem permanecer: os peditórios e oferendas alimentares, o carácter jocoso das celebrações ou o espírito de pândega e licenciosidade manifesto especialmente no comportamento dos mascarados, que correm pelas ruas gritando e chocalhando as raparigas solteiras.
Máscaras Africanas
As máscaras africanas, pela sua diversidade e qualidade estética, são consideradas uma das manifestações artísticas por excelência do continente africano. Elas marcam presença em vários momentos centrais na vida das sociedades tradicionais, nomeadamente em momentos de transição de indivíduos ou grupos, nos denominados ritos de passagem. Assim, as performances com máscaras tendem a acontecer em nascimentos, casamentos, entrada das crianças na idade adulta ou funerais. Nestas celebrações os mascarados saem à rua, na maioria das vezes disfarçados dos pés à cabeça, para participar nas cerimónias, marcadas pela música e pela dança. Apesar das máscaras apresentarem interpretações muito diversas, consoante os grupos a que pertencem, a grande maioria é associada a espíritos da natureza ou dos antepassados.
O seu uso é um momento de comunicação com o mundo sobrenatural, onde se realizam demandas em troca de oferendas. O portador da máscara, por sua vez, abandona temporariamente a sua personalidade para assumir as características do espírito representado e, tal como nos contextos rurais europeus, o seu comportamento é excêntrico e subversivo.
Maioritariamente feitas em madeira e com traços ideais estilizados, as máscaras africanas sempre causaram um fascínio particular no mundo ocidental, provocando impressões díspares, que vão da rejeição à adoração.
MÁSCARAS – Rituais e Celebrações, Farsas e Transgressões
Data:
06 Fevereiro > 30 Março 2016
Local:
Galeria Cruzes Canhoto, Rua Miguel Bombarda, 452, Porto
Curadoria:
Cruzes Canhoto e Maria Manuela Restivo (antropóloga)
Textos:
Maria Manuela Restivo
Fotografias:
Nuno Marques / Cruzes Canhoto
Um agradecimento especial à Academia Ibérica da Máscara, na pessoa do seu presidente António André Pinelo Tiza, por toda a informação fornecida e pelo apoio que nos foi dado no contacto directo com os construtores de máscaras de Trás-os Montes.
Todas as obras expostas no espaço da Cruzes Canhoto estão agora disponíveis para aquisição online.
Para o fazer, entre em contacto directo com a galeria.