A Plasticidade Ecotrópica na Botânica Ficcionada de Miguel Pipa

A:
«Não existe fronteira nenhuma que nos possa separar. Estamos infinitamente ligados e fazemos parte de um todo de um tamanho inalcançável.»

[Miguel Pipa, 2021]

B:
Miguel Pipa nasceu em 1980 nas Caxinas, o peculiar bairro de pescadores de Vila do Conde.
Sem formação académica por opção, sempre demonstrou uma permanente inquietação face ao exterior que o circunda e uma constante curiosidade por aquilo que está por detrás das coisas.
Nele, nada é adquirido. Tudo o que lhe chega às mãos é questionado, desmontado e reprocessado.
Foi assim que começou a experimentar na área da música electrónica investigando novas possibilidades sonoras que os instrumentos clássicos poderiam oferecer quando manipulados de forma alternativa ou criando ele próprio novos instrumentos a partir dos mais variados objectos do quotidiano.
Ao longo da última década, seguindo os princípios do ecotropismo, tem vindo a criar em desenho um mundo de micro-organismos mutantes interligados que ele denomina de botânica ficcionada.
Apresenta o seu trabalho, pela primeira vez ao público, em Setembro de 2021, na exposição “Microecotropias”, na galeria Cruzes Canhoto, no Porto.

C:
Ecotropismo é derivado de Eco+Tropismo, que significa voltar-se para a Terra. O termo ‘ecotrópico’ apareceu pela primeira vez na literatura, pela escrita do poeta John Campion, em “Toward an Ecotropic Poetry” (1974), mas foi rapidamente difundido por diversas áreas da ciência, sobretudo as de carácter ambiental, que insistem na construção de uma nova relação cultural humana com a Terra. A filosofia básica do ecotropismo e dos ecotrópicos argumenta que, para ser saudável, a cultura humana deve habitar um nicho ecológico e, assim, relacionar-se apropriadamente com todas as forças co-evolutivas, orgânicas e inorgânicas. Em suma, os humanos devem voltar-se para o meio ambiente, para um futuro sustentável com sentido.

D:
«A planta encarna o laço mais estreito e mais elementar que a vida pode estabelecer com o mundo. O inverso também é verdadeiro: ela é o observatório mais puro para se poder contemplar o mundo na sua totalidade. Debaixo do sol ou das nuvens, misturando-se com a água e com o vento, a sua vida é uma interminável contemplação cósmica, sem dissociar os objectos e as substâncias, ou, dizendo-o de outro modo, aceitando todas as nuances, até se fundir com o mundo, até coincidir com a sua substância. Nunca compreenderemos o que é uma planta sem termos compreendido o que é o mundo.»

[Emanuele Coccia, in A Vida das Plantas – Uma Metafísica da Mistura, 2019]