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IDALÉCIO
Metalúrgico Sexagenário
Idalécio é um artista outsider, auto-didacta, nascido em 1952, numa aldeia do interior do distrito de Aveiro.
Na casa rural onde cresceu como órfão de pai, foi criando espontaneamente sem pretensões artísticas nem interesse em revelar o acervo que foi acumulando ao longo da sua vida. Não fosse um feliz acaso, em finais de 2015, dificilmente se teria chegado ao mundo secreto deste metalúrgico sexagenário. Lá chegados, a surpresa não poderia ter sido maior, pois esperavam-nos mais de um milhar de pinturas e algumas centenas de esculturas, que só os familiares mais chegados tiveram, até então, oportunidade de apreciar.
Após a morte do tio, com quem viveu desde os três anos de idade, Idalécio, já adulto e a trabalhar no departamento de produção de uma fábrica de metalurgia, volta à casa onde passou a infância e a adolescência e converte parte das dependências em galerias surrealistas, totalmente preenchidas pelas suas invulgares criações, enquanto que a outra parte da casa é destinada a funcionar como um museu onde é preservada a memória de várias culturas populares vividas e descontinuadas ao longo de quase um século.Tudo apresentado num imenso caos organizado como se resultado de um processo entrópico, obsessiva e meticulosamente controlado pelo artista.
Perante a imensidão e a riqueza deste universo fantástico, havia que juntar esforços no sentido de o tornar acessível ao mundo dos amantes de arte, e foi isso que se tentou fazer nas semanas que se seguiram, promovendo múltiplos encontros e conversações. Nessa altura, porém, descobrimos em simultâneo o temperamento menos fácil deste homem, que para nossa surpresa foi mostrando resistência a expôr as suas peças, pelo que só ao fim de cinco meses é que pudemos ouvir o tão esperado: «‘tá bem, pode levá-las», ainda que logo de seguida não deixasse de ter lançado um «mas primeiro tem que m’as pagar!».
Em Abril de 2016, é finalmente inaugurada a exposição “D’Idalécio… Todos Temos um Pouco”, no Porto, na galeria Cruzes Canhoto, mostrando-se pela primeira vez ao público as suas esculturas e os seus quadros, com enorme sucesso, dando início a uma nova fase criativa do autor e a uma nova forma de trabalhar da galeria. Ainda assim, apesar de ter vendido umas largas centenas de peças de arte, Idalécio preferiu manter-se no anonimato e continuar na fábrica onde sempre trabalhou, criando apenas nos seus tempos livres.
A dualidade que caracteriza ainda hoje a sua vida, com dois mundos social e culturalmente bem vincados, de confronto entre uma vivência adulta materialmente burguesa e uma outra de origem rural e humilde, é resolvida através da expressão artística, sendo claramente perceptível no conjunto da sua obra.
As suas telas, apesar de marcadas por figurações exuberantes e maximalistas, são definidas por traços seguros, e por uma combinação de cores irrepreensível, qualquer que seja a paleta escolhida, numa construção harmoniosa e elegante. Por outro lado, as esculturas, sobretudo as mais recentes, são quase todas monocromáticas e construídas com pedaços toscos de madeira, usando como ferramenta quase em exclusivo um machado, o que lhes confere um aspecto bruto, primitivo e minimal.
Como todos os colectores compulsivos, guarda em caixas enormes centenas de objectos inúteis de todo o tipo que aproveita para aplicar nas esculturas que constrói. O mesmo espírito de não-desperdício é usado nas pinturas, quando no final de cada sessão utiliza o resto das tintas de óleo ou de acrílico para experimentar combinações de formas ou de cores nas folhas de jornal que usa para proteger o espaço de trabalho.
Artista pop e populista, surreal e tropicalista, Idalécio inspira-se fortemente na arte popular portuguesa, de que é apreciável conhecedor, sendo um habitual frequentador das festas, romarias e feiras de artesanato que se realizam por todo o país. Ali, recupera alguns dos elementos e motivos do imaginário rural, em que o sagrado e o profano seguem quase sempre a par, para desferir duras e sarcásticas críticas aos poderes instituídos, em especial aos herdados da cultura judaico-cristã.
De forma inusitada, conjuga a linguagem dos mestres artesãos portugueses com algumas das expressões da arte tribal africana, de que é igualmente coleccionador, particularmente das chamadas ‘power figures’, a que não será alheio o facto de ter cumprido o serviço militar no interior de Moçambique no início dos anos 70.
Se no início da sua actividade criativa são evidentes algumas incoerências estilísticas – picando aqui e ali de tudo com que se cruzava na sua inocente curiosidade natural –, na produção mais recente é perceptível uma maior coesão de estilos, formas e temas, resultado de um processo evolutivo bem sucedido na direcção de uma linguagem própria absolutamente singular.
IDALÉCIO
Metalúrgico Sexagenário
Data:
23 Setembro > 31 Dezembro 2017 + Uns Dias
Local:
Galeria Cruzes Canhoto, Rua Miguel Bombarda, 452, Porto
Curadoria:
Cruzes Canhoto
Textos:
Tiago Coen / Cruzes Canhoto
Fotografias:
Nuno Marques / Cruzes Canhoto
Todas as obras expostas no espaço da Cruzes Canhoto estão agora disponíveis para aquisição online.
Para o fazer, entre em contacto directo com a galeria.
PINTURAS
ESCULTURAS
Outras peças de Idalécio podem ser vistas nestas páginas:
Página do artista
Exposição “D’Idalécio, Todos Temos Um Pouco”
Exposição “Santos, Diabos e Outras Bestas”
Exposição “Vade Retro”
Exposição “Desvios e Extravios”
Exposição “Desvios e Extravios 2”
Exposição “Desvios e Extravios 3”
LIVRO
A propósito desta exposição, a Cruzes Canhoto lança o livro “Idalécio – Metalúrgico Sexagenário”,
onde se apresenta de uma forma mais aprofundada o universo deste artista singular.
48 páginas profusamente ilustradas a cores, com capa em tela, com a dimensão de 20x20cm.
Edição:
Cruzes Canhoto
Coordenação Editorial:
Tiago Coen / Cruzes Canhoto
Textos:
Tiago Coen / Cruzes Canhoto
Fotografia e Edição de Imagens:
Nuno Marques / Cruzes Canhoto
Desenho Gráfico:
Pedro Soares / Cruzes Canhoto
Impressão:
Orgal
Agradecimentos:
Idalécio Carvalho
Edição de 300 exemplares